sábado, 1 de abril de 2006

Software Livre: Remédio Genérico do Software


A experiência brasileira com os remédios genéricos chama a atenção dos observadores atentos aos cenários de políticas tecnológicas. O interesse público, a apropriação dos benefícios do progresso técnico e a inclusão social são alguns dos temas direta ou indiretamente relacionados com a polêmica sobre a “quebra de patente” dos remédios necessários ao tratamento da AIDS. Tema igualmente polêmico e que tem recebido, em tempos recentes, destaque. na imprensa é o Software Livre.


Conceitualmente o termo Software Livre induz a ambigüidades já que a tradução de free confunde software gratuito com .livre. Para fugir dessa ambivalência muitos preferem empregar o conceito “öpen source software ou programa de computador de fonte aberta ou ainda software de código aberto. Não são exatamente a mesma coisa. A principal diferença reside na possibilidade do programa código aberto/fonte aberta permitir ao elo final da sua utilização o fechamento do código para uso proprietário.

Assim, software livre não significa programa gratuito mas dotado das 4 liberdades da licença GNU: liberdade para executar o programa para qualquer fim, liberdade de estudar o programa e adaptá-lo; liberdade de redistribuir cópias ; liberdade de melhorar e publicar as melhorias do programa. O programa nasce e se desenvolve livre. Em contraposição ao software livre encontra-se o software proprietário cujos códigos do programa não podem sofrer alterações nem são totalmente conhecidos do usuário. Ao usuário cabe exclusivamente a função de operador da caixa preta cuja construção desconhece. Nesse contexto, o desenvolvimento do software se dá sob condições do sigilo industrial, com a propriedade intelectual, o direito de autor desempenhando papel crucial. O pagamento de royalties e assemelhados constituem as motivações econômicas dominantes.

Embora criado há cerca de 20 anos, o conceito de software livre tornou-se conhecido mais recentemente em nosso país em virtude da adoção de políticas públicas destinadas a estimular sua difusão. Cabe registrar que o primeiro grande esforço realizado em nosso país e conhecido à época como desenvolvimento de um “UNIX Like “ ocorreu sob a liderança da COBRA COMPUTADORES, empresa com fábrica localizada no bairro carioca de Jacarepaguá

Pretendia-se que o SOX fosse adotado como o sistema operacional dos microcomputadores da nascente indústria nacional de computadores. Era um audacioso projeto de desenvolvimento cooperado destinado a mobilizar um grupo de empresas nacionais que competia entre si nesse mercado. O projeto foi abandonado prematuramente em virtude das empresas nacionais terem adotado o caminho de operadoras de caixa preta como estratégia de sobrevivência num mercado que passava a enfrentar a acirrada competição dos importados. Além de não disporem de recursos de investimento suficientes para desenvolver e manter seus próprios sistemas operacionais, também lhes faltava a compreensão da utilidade do desenvolvimento cooperado. Não deixa de ser curioso observar que os famosos PCs (personal computer) hardwares de arquitetura aberta portanto mais facilmente industrializáveis continham em contrapartida os softwares proprietários MS DOS por exemplo. O abandono do SOX representou uma oportunidade perdida de criação de um genérico num momento crucial do desenvolvimento .dessa indústria.

O debate sobre modelos de desenvolvimento tecnológico no campo do software torna –se ainda mais crítico quando associado aos desafios da inclusão digital, parte importante do inadiável combate à exclusão social A necessidade de incluir milhões de cidadãos requer fórmulas arrojadas, serenas porém muito firmes. O software livre é a alternativa estratégica para os programas urgentes de inclusão digital. da mesma maneira que os remédios genéricos o são para a AIDS. É o genérico do software. A mobilização generosa e solidária das boas equipes das universidades ,colégios, telecentros e outras instituições de interesse público é essencial. A educação é área nobre para o desenvolvimento e disseminação do software livre.. Isto por razões de ordem estratégica e econômicas. O Brasil remete anualmente para o exterior por conta de importação de software cerca de 1bilhão de dólares. Exporta apenas 100 milhões de dólares. .O simples anúncio de que se cogita incorporar o software livre Linux no Projeto do Computador Conectado- projeto governamental destinado a promover o uso do computador em classes de menor poder aquisitivo e distanciadas dessa tecnologia- já provocou grande rebuliço. A imprensa noticiou em abril passado que a MICROSOFT se preparava para oferecer redução de 150 dólares para 30 dólares no valor de uma cópia do Windows que saia da fábrica dentro dos computadores destinados ao programa. Volta-se a falar em livre escolha, concorrência, competição. .É’ oportunidade de revisitar conceitos rotineiramente empregados de forma, no mínimo, discutível. Por exemplo, nos concursos para recrutamento de empregados é usual o teste de conhecimento sobre a operação de uma marca específica de software e não de um tipo de programa de computador. Diferentemente da seleção de um motorista - quando ninguém acharia natural uma prova de motorista de Volks ou de Ford em lugar de Motorista de Automóvel- seleciona-se operador de produto de uma marca: excel, word, acces ao invés de um operador de planilha, editor de texto, banco de dados. É diferença sutil que vale milhões de dólares em cópias de software, royalties, alimenta um mercado de cursos e exclui os que não têm acesso ao conhecimento dessa marca.

Só pagando. E muito caro!



Arthur Pereira Nunes

Graduado em Administração pela Fundação Getúlio Vargas e Pós Graduação no IIAP- Paris Participou da implantação da Política Nacional de Informática, ocupou cargos técnicos e de direção no setor privado e na área pública.. Atualmente é assessor especial do Ministro da Ciência e Tecnologia
24/Jun/2005

Nenhum comentário: