sábado, 1 de abril de 2006

Sudesenvolvimento do sudesenvolvimento


A Comissão Econômica para América Latina (CEPAL) divulgou, ao final do ano, estudo intitulado Balanço Preliminar das Economias da América Latina e Caribe 2005. Nele encontram-se dados sobre o desempenho recente das economias da região.
De acordo com esse organismo internacional, a média de crescimento do Produto Interno Bruto(PIB) alcançou a taxa de 4,3% em 2005. As economias com maiores taxas no ano foram: Venezuela (9%), Argentina (8,6%) seguidas do Chile, Uruguai, Panamá e Peru com 6%. Dentre os países com menor crescimento o Brasil com 2,5% supera apenas o Haiti com 1,5%. Para cada país provavelmente existirão muitas explicações. Contudo é preocupante constatar que economias de países em desenvolvimento situados em outras áreas do planeta apresentaram taxas superiores às observadas na região.”A América Latina está crescendo menos do que o conjunto dos países em desenvolvimento” diz a CEPAL.
Qual explicação para tal cenário? E o Brasil como se situa nesse quadro?
Sem dúvida, umas das razões a influenciar essa tendência reside na drástica mudança da estrutura da indústria. Para tanto contribuíram as políticas macroeconômicas e de abertura comercial adotadas em grande número de países da região, sobretudo a partir dos anos 80 e 90. Gradualmente, o conceito de desindustrialização perdeu a conotação negativa de desmonte ou destruição da indústria para se tornar quase um objetivo a alcançar. Na lógica das nações desenvolvidas pode fazer algum sentido o declínio da participação da indústria na composição do Produto Interno Bruto (PIB) e no emprego, se, em contrapartida, aumentar o dinamismo do setor serviços. O crescimento desse último poderia ser entendido como melhoria do nível de vida. Numa versão estereotipada representaria uma evolução: agronegócios, em seguida indústria e, em estágio posterior, serviços. Entretanto, a compreensão do sentido e natureza desse processo é imprescindível para evitar a corrida atrás de miragens. O fenômeno da terceirização é um caso típico. Do ponto de vista de uma nação, o processo de terceirização no âmbito de um segmento industrial apresenta conseqüências radicalmente distintas segundo a existência ou não de domínio tecnológico. Numa empresa que domina o processo tecnológico, a distribuição das diversas etapas da elaboração do seu produto pelo mundo é por ela comandada e submetida às suas escolhas ( inclusive a decisão sobre o que terceirizar ou manter intra muros). Quando se trata de empresa que não domina o ciclo de desenvolvimento e produção de um produto, a distribuição e fragmentação eficiente das diversas etapas de produção é extremamente difícil ou mesmo inviável. A terceirização de etapas menos elaboradas da produção a partir das nações desenvolvidas que controlam o ciclo de desenvolvimento tecnológico apresenta efeitos substancialmente distintos nos países que venham a receber essa produção planejadamente descentralizada ou fragmentada. Nesse contexto, a desindustrialização numa nação industrialmente madura (que domina as diversas etapas do ciclo de desenvolvimento e produção tecnológica), decorrente da decisão de terceirizar a produção, por exemplo, é determinada por razões de estratégia comercial ou econômica. Mas o controle tecnológico permanece. A fragmentação das atividades e sua re-alocação em terceiros, obedece a critérios distintos e próprios. A perda de determinados postos de trabalho no setor industrial é compensada pela geração de emprego e renda no setor de serviços mediante aumento de demanda de mão-de-obra de mais alta qualificação e remuneração. Ainda assim, crescem nas nações desenvolvidas as críticas à terceirização. Até mesmo a perda de postos de trabalho de baixa e qualificação é questionada.
Já aos países em desenvolvimento, de industrialização precária e que não detêm o domínio tecnológico, resta apenas operar como fornecedor de mão -de- obra para as atividades de baixa qualificação (e baixa remuneração). A competição para atrair empreendimentos se dá mediante sucessivas reduções no custo do trabalho, na tributação ou nos incentivos fiscais crescentemente generosos.
Ainda hoje é quase impossível dissociar a CEPAL da lembrança de Celso (Ver O Brasil do século XX (199 Kb) ), e Raul Prebish. Seus estudos sobre o subdesenvolvimento e a industrialização baseada na substituição de importações marcaram uma geração. Os números do Balanço Preliminar, divulgados por aquela instituição, ensejam importantes indagações. A redução do peso relativo do setor industrial, no PIB e no emprego, teria contribuído para as baixo crescimento, num contexto de desaceleração econômica e de abertura comercial concomitante à adoção de políticas macroeconômicas que penalizaram o sistema produtivo?
A América Latina vem perdendo gradualmente em posição relativa frente aos países da área do Leste da Ásia e Pacífico que apresentam taxas médias de crescimento do setor industrial (10% ao ano) superiores significativamente aos 2% anuais verificados na nossa região. As baixas taxas médias nos últimos anos e o retardamento da América Latina com respeito a outras regiões estariam a indicar um preocupante ciclo de subdesenvolvimento do próprio subdesenvolvimento. Neste caso, a atividade industrial e tecnológica pode estar a desempenhar papel crucial juntamente com as políticas macroeconômicas.

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